Por Raoni de Assis
Há algum tempo muitas pessoas estão reclamando do uso extensivo do verde-amarelo em ações claramente de fundo político. Por isso resolvi escrever essas breves linhas, com o objetivo de denunciar essa apropriação política dos símbolos nacionais por uma fatia conservadora da sociedade alicerçada em um discurso incutido ainda nos tempos da Ditadura Militar e que ainda está fortemente presente nos dias atuais. Não é à toa, inclusive, que tem gente que vê em Dilma e no PT uma “ameaça comunista”.
Importante que se deixe claro para que possamos iniciar este debate, que “símbolos nacionais” já são uma construção historicamente realizada, dentro da tentativa de consolidar Estados-nações e isso já foi amplamente estudado pela historiografia. A construção de narrativas históricas que engradecessem personagens, momentos, símbolos não é algo “que só existe no Brasil” (aliás como esta frase é usada para tudo ultimamente).
Nos últimos tempos temos visto um festival de “verde-amarelismo” e “hino-nacionalismo” em manifestações de rua pelo Brasil. A utilização do que seria “símbolos” nacionais por uma parcela da sociedade crítica ao governo Dilma Rousseff (PT) tem sido evidente, em uma tentativa clara de apropriação política deste conjunto de símbolos e de separação entre os que “defendem o país, seus símbolos e seus costumes” e aqueles que “usurpam a pátria”. Um dos gritos usados, principalmente na manifestação do dia 15, e que talvez possa representar melhor isso é “a nossa bandeira jamais será vermelha” como se uma ameaça assim estivesse em voga.
Essa tentativa de apropriação política do verde amarelo, como por exemplo no uso da camisa da seleção brasileira, acaba por deixar muitas pessoas, que não concordam com os posicionamentos políticos destas manifestações em uma espécie de defensiva quanto ao uso das cores nacionais e da camisa da Seleção, esta última, querendo ou não, faz parte da construção da imagem do Brasil. Desde o primeiro título mundial, a amarelinha é usada como forma de exaltação de que “sim, nós podemos”. Nelson Rodrigues chegou a falar em fim do “complexo de vira-latas” com o título mundial de 1958.
Nos anos setenta a Seleção e a camisa amarelinha já foram usadas pela Ditadura Militar para ajudar a manter o regime. Aliás junto com outros slogans ufanistas, como “Brasil ame ou deixe-o”, como se a crítica a quem está no poder fosse uma crítica ao país. Ditadura esta, que soube usar e incutir na população o verde-amarelismo no combate ao perigo vermelho da ameaça comunista (qualquer semelhança com o discurso atual não acredito que seja mera coincidência).
Muita gente criticou o uso da camisa amarela da CBF nas manifestações que defendiam o “combate a corrupção”. E vamos convir que é, no mínimo, contraditório o uso desta camisa com o emblema da CBF para protestar contra a corrupção! Aliás, uma camisa que inclusive, custa hoje mais de R$ 200 reais, ou seja, bem longe do alcance de uma grande parcela da população. É claro que, por exemplo, essa discussão nos levará ao debate se a camisa amarela é da seleção ou da CBF, mas não será neste artigo que entraremos nesta questão específica.
Uma outra crítica frequente foi o “clima de Copa do Mundo” nas manifestações. Vuvuzelas, selfies, gritos de torcida e uma grande quantidade de camisas e bandeiras nos fizeram realmente lembrar de dias de Copa – que inclusive foi muito criticada por muitos dos presentes nas manifestações.
No entanto, um exemplo de como os símbolos nacionais podem ser utilizados por diversos campos políticos é o hino nacional. Atualmente usado nas manifestações de caráter mais conservador e na Ditadura utilizado em forte escala para também exaltar o nacionalismo conservador, o hino nacional também já foi usado como forma de resistência. Entoado em manifestações e em outros momentos, o hino brasileiro era utilizado pela resistência à Ditadura para impedir que os militares avançassem sobre manifestos.
O leitor deve estar se perguntando: O que estamos querendo dizer com isso? A resposta é Simples. Não devemos identificar apenas um grupo ou pensamento político como “dono” do direito de uso das cores nacionais ou dos “símbolos pátrios” que historicamente foram construídos para a identificação nacional. Essas significações que se pretendem com o uso das “cores nacionais” acabam por tentar homogeneizar massas e ideias que são extremamente heterogêneas e vem daí o seu importante uso político. Ninguém que, por exemplo, não votou no Aécio ou não quer a intervenção militar deve sentir constrangido em usar a camisa Canarinho (mas de preferência não vá com uma da CBF protestar contra a corrupção rs).
Paulo Braga
23 de março de 2015 às 10:08
Brilhante. Eu estava há muito tempo falando sobre isso com as pessoas do meu convívio. Acho inteiramente desagradável adjetivar alguma coisa como propriedade política de alguém.
Parabéns!!!!!
Amanda
23 de março de 2015 às 14:00
Oi Raoni. Achei o texto muito bom e estava pensando também sobre isso. Gostaria de sugerir debater mais a Reforma Política.
Continuo aqui, porque vocês estão demais