Um remédio para esclerose múltipla é o primeiro à base de canabidiol (CBD) a ser fornecido pelo Governo do Paraná. Desde o início de setembro pacientes com a doença autoimune, que afeta o sistema nervoso central, podem fazer a solicitação ao estado. Veja a seguir como fazer o pedido.
O medicamento de tetraidrocanabinol (THC) associado a canabidiol (CBD) se chama Mevatyl e, conforme a Secretaria de Estado de Saúde do Paraná (Sesa), é usado no tratamento de pacientes com espasticidade moderada a grave causada pela esclerose múltipla.
A espasticidade é um sintoma que provoca rigidez e dificuldade na movimentação dos músculos.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) registrou o remédio em julho de 2022 no Brasil, o primeiro à base de cannabis sativa, gênero da planta a partir da qual também se produz a maconha.
De acordo com a Secretaria de Saúde, a medicação é fornecida na forma de frasco spray com 10 ml e cada unidade custa R$ 859,92. A distribuição, diz o governo, acontecerá nas farmácias das 22 Regionais de Saúde.
O médico Leonardo Valente de Camargo, diretor do Departamento de Neurologia da Associação Médica de Londrina e membro da Câmara Técnica de Neurologia e da Comissão de Doenças Raras do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), explica que a associação entre THC+CBD minimiza os efeitos da espasticidade, que afeta de 60% a 90% dos pacientes.
“Enquanto o THC alivia a espasticidade e a dor muscular, o CBD ajuda a equilibrar o impacto, reduzindo os efeitos adversos. Estudos demonstraram que essa combinação reduziu a espasticidade e apresentou uma melhora da qualidade de vida dos pacientes, além da redução da dor”, explica.
O médico avalia que a medicação parece ser uma opção eficaz e segura para o tratamento desses sintomas, “particularmente em quem não teve alívio suficiente com as terapias convencionais”.
A possibilidade de ter acesso gratuito a uma nova forma de controlar os sintomas da esclerose significa uma esperança para quem convive com a esclerose múltipla há anos, como é o caso da bióloga Célia Batista Martins, moradora de Londrina.
Ela recebeu o diagnóstico em 1998, após sentir alguns sintomas como dores e dificuldades na locomoção. Na época, as informações sobre a esclerose múltipla ainda eram poucas e havia outro obstáculo: a região de Londrina não oferecia tratamento.
Célia é fundadora e atual representante da Associação Londrinense dos Portadores de Esclerose Múltipla (Alpem).
“O meu neurologista foi quem proporcionou a aproximação de outras pessoas. Formamos um grupo pequeno, que foi aumentando ao longo do tempo, e isso já fazem 24 anos. Quando eu consegui o tratamento, decidi partilhar essa luta. Um dos nossos objetivos é justamente esse, compartilhar as histórias, ajudar uns aos outros”, relata.
Ao longo dos anos ela fez uso de diversos medicamentos e foi informada pelo neurologista que a acompanha sobre a inclusão do canabidiol no controle da esclerose. Porém, a adesão ao medicamento não foi imediata.
“Eu passei por vários tratamentos, fisioterapia, hidroterapia, pilates, sempre buscando melhorar a condição de vida. No começo fiquei bem resistente, porque achei que deveria esperar mais um pouco até que se comprovasse a eficácia. Comecei a aplicar há poucas semanas, porque agora, vendo que realmente é eficiente, achei que deveria tentar”, explicou.
Agora, Célia disse que pretende pedir ao Governo do Paraná o medicamento à base de canabidiol.
Regulamentação é recente no Paraná
Em fevereiro, o Paraná começou a regulamentar os medicamentos à base de canabidiol e tetrahidrocanabinol, entre eles o que trata a espasticidade causada pela esclerose múltipla.
Especificamente para estes sintomas, o processo foi finalizado em 2 de setembro, com a publicação no Diário Oficial do Estado de uma resolução com os critérios do tratamento.
O acesso a medicamentos produzidos à base de canabidiol e tetrahidrocanabinol é garantido no Paraná pela Lei Pétala, promulgada em 13 de fevereiro de 2023 pela Assembleia Legislativa.
A legislação tem esse nome em referência a uma menina de cinco anos, que foi diagnosticada com uma doença rara que afeta o desenvolvimento neurológico e simboliza pacientes paranaenses que usam esse tipo de remédio, mas têm dificuldade para conseguir pelos altos custos.
Quem tem direito ao medicamento?
De acordo com a regulamentação, o tratamento é destinado a pacientes acima de 18 anos, com diagnóstico clínico de espasticidade moderada a grave com grau de 2 ou 3 na Escala de Ashworth e ausência de melhora ou presença de contraindicação ou intolerância ao uso de outros tratamentos, como baclofeno, dantroleno, Diazepam, gabapentina, tizandina e toxina botulínica.
O tratamento não é destinado a pacientes que se enquadrarem em qualquer um dos requisitos abaixo:
- Histórico suspeito ou conhecido de esquizofrenia ou outra doença psicótica;
- Histórico familiar de esquizofrenia ou outra doença psicótica;
- Histórico de transtorno de personalidade grave ou outros transtornos psiquiátricos significativos, exceto depressão associada com sua condição subjacente;
- Histórico de epilepsia ou convulsões recorrentes;
- Histórico de dependência química a Cannabis sativa;
- Gravidez e lactação;
- Idoso frágil com risco de quedas;
- Espasticidade graus 0, 1, 1+ e 4 de acordo com a Escala de Ashworth modificada.
De acordo com a secretaria, o paciente deverá ir até a farmácia da regional de saúde fazer a solicitação, que será cadastra e passará por uma avaliação médica, que pode demorar até 30 dias.
Em seguida, se o pedido for autorizado, a disponibilização do medicamento deve levar mais 30 dias. A Sesa afirma que vai comprar o medicamento somente para pacientes que se cadastrarem.
Como fazer o pedido do medicamento?
Para solicitar o medicamento à base de THC + CBD, o paciente deverá apresentar os seguintes documentos:
- Cópias do documento de identidade, do comprovante de residência e do cartão nacional de saúde
- Prescrição médica de neurologista
- Laudo de solicitação, avaliação e autorização de medicamentos
- Relatório médico específico totalmente preenchido por neurologista
- Escala expandida do estado de incapacidade (EDSS) – não é necessário apresentar se o resultado estiver contido no relatório médico específico
- Escala de Ashworth modificada, aplicada por neurologista – não é necessário apresentar se o resultado estiver contido no relatório médico específico
- Escala visual de avaliação numérica de espasticidade, aplicada por neurologista – não é necessário apresentar se o resultado estiver contido no relatório médico específico
- Cópia do laudo de ressonância magnética de encéfalo – apenas para pacientes não cadastrados no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) da esclerose múltipla
- Termo de esclarecimento e responsabilidade
A relação dos documentos também foi disponibilizada na internet. A primeira renovação da solicitação vai ocorrer no final das seis primeiras semanas. As outras renovações ocorrerão a cada seis meses.
Paciente será monitorado
Conforme a Secretaria de Saúde, o paciente será monitorado durante seis semanas de tratamento, que será mantido para aqueles que tiverem pelo menos 20% de melhora nas escalas de Asworth e a visual de avaliação numérica de espasticidade.
Após esse período, o monitoramento será repetido a cada seis meses para avaliar a manutenção dos resultados iniciais.
Segundo a secretaria, os pacientes que não apresentarem pelo menos 20% de melhora em uma das escalas após seis semanas, não mantiverem o resultado após as seis semanas e tiverem eventos adversos graves ou intoleráveis não seguirão com o tratamento à base de THC + CBD, que deve ser indicado e supervisionado por um neurologista.
Com G1 Paraná