Por causa dos acontecimentos envolvendo o futebol brasileiro nos últimos meses, aliado com a Copa América e a falta de interesse que esse torneio infelizmente desperta (não é de hoje) em nós brasileiros, resolvi fazer uma breve explanação sobre o futebol quanto cultura popular. Para abordar o tema, resolvi usar um pouco do discurso da imprensa a respeito do velho esporte bretão.
Durante toda minha vida escutei o velho chavão que o “Brasil é o país do futebol”. Chavão também refutado pela imprensa e por parte dos brasileiros, principalmente por causa dos últimos resultados da seleção brasileira de futebol. Agora, desconsiderando a eterna bagunça em nossa Confederação e a bagunça em nossa organização, porque não seriamos mais o país do futebol? Acho muito simplista olharmos apenas para o resultado dentro de campo, ainda mais se olharmos para trás e vermos que o selecionado nacional chegou entre as quatro melhores seleções (2 títulos, 1 vice e 1 quarto lugar) em quatro (4) dos últimos seis (6) mundiais, além de ter sido campeã de quatro das últimas seis Copas América.
Quero me ater a algo um pouco mais profundo. De acordo com as pesquisas sobre os clubes mais populares, em torno de 78% a 80% dos brasileiros tem um time do coração. Isso faz com que praticamente todos nós tenhamos um time para chamar de seu, ou conhecemos muitas pessoas que tenha. Isso por si só é um fenômeno não só no Brasil, mas praticamente em toda cultura ocidental. Só isso se torna um prato cheio para a mídia vomitar “verdades”, uma busca desenfreada pela audiência.
Numa cultura em que parte da população desenvolveu uma mentalidade reacionária e conservadora, em que a baixa estima é explorada e incentivada até dizer chega, não é difícil perceber o quanto a imprensa explora e se porta como verdadeiros profetas do apocalipse. Vejamos.
“O Brasil perdeu da Colômbia por 1 a 0 e no, jogo seguinte, os jogadores decidiram não falar com a imprensa”. Não estamos falando do jogo da semana passada em que a seleção foi derrotada pelos colombianos, mas sim de 1985, quando a Folha de S. Paulo publicou matéria falando sobre o vexame do futebol brasileiro ao perder para a Colômbia.
No dia 22 de junho de 1986, a mesma Folha de S. Paulo foi dura, mantendo a mesma linha editorial que a maioria da imprensa trabalha hoje. Naquela ocasião, as linhas que me chamaram atenção eram… “quem poderia emocionar-se com uma seleção em que o raciocínio de Sócrates e Júnior não é acompanhado pelas pernas?”. Em alusão a eliminação da seleção frente à França na Copa de 1986. Ou ainda a nota de 06 de julho de 1982 referentesà derrota da seleção para a Itália naquele Mundial, “Seleção confunde jogar na defesa com covardia”, e falavam da falta de padrão tático e os problemas que Tele Santana teriam com os jogadores. Em 25 de junho de 1990 mais uma condenação ao futebol brasileiro com a matéria “ Triste realidade ter que conviver com passado tão luminoso e futuro tão ameaçado”.
Hanna FenichelPitkin (1967) diz que o conceito de representação tem um significado altamente complexo, mas dentro dessa complexidade podemos colocar o futebol como representante legitimo da cultura popular. Esse esporte está amplamente enraizado no imaginário brasileiro. Mesmo que alguns segmentos queiram desqualificar essa representação, ela está em nosso DNA enquanto latinos. A CBF, Conmebol, FIFA…eles não são donos da nossa paixão, não mandam em nossos sentimentos e sensações. O próprio contexto histórico mostra que a relação da imprensa com o futebol nem sempre é amistosa. Pernas de pau? Para os profissionais da mídia eles sempre existiram. Para eles o melhor sempre está no passado e o futuro sempre será sombrio e nebuloso. Se for ser, não sei, sou historiador e não vidente, mas uma coisa é certa. Não podemos deixar que roubem uma parte da nossa cultura popular. Não importa se é cultura material ou imaterial, o que importa é que temos algo vivo que respira, e isso é o futebol.