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Coluna do Emílio Gonzalez

Coluna do Emílio Gonzalez – Paraná, 29 de Abril de 2015: A Educação em Luta

Coluna do Emílio

Por Emílio Gonzalez

Quarta-feira, 29/04/2015. Este foi um daqueles raros dias em que eu senti vergonha de ser paranaense, de ser do mesmo Estado da federação que reelegeu esse monstro fascista chamado Beto Richa.

Não consigo encontrar palavras para expressar a minha indignação, que também é de milhares de professores, e milhões de paranaenses – pais, alunos, trabalhadores em geral – que, mesmo tendo votado neste assassino, provavelmente não concordam com a tirania e a barbárie na qual Beto Richa transformou nosso querido estado do Paraná.

Ontem, o dia todo, através das redes sociais (Twitter, youtube, facebook, Instagram) chegavam até nós relatos, fotos, vídeos e informações (algumas até desencontradas) sobre o massacre que estava acontecendo no Centro Cívico de Curitiba. Cerca de 1.600 policiais de todo o Estado foram deslocados até a capital para cercar a Assembléia Legislativa do Paraná (ALEP), onde estava sendo votado um projeto que altera o sistema previdenciário do funcionalismo público (ParanáPrevidência). Na prática, a alteração permitirá ao governo utilizar o dinheiro deste fundo previdenciário para sanar as contas do Estado. Richa alega que o Paraná está quebrado. Se for assim, também é resultado de sua própria má-gestão, dado que Richa ocupa o mando do Estado desde 2011. O governador foi reeleito em outubro passado contando mil maravilhas sobre a saúde financeira do Estado do Paraná, mas depois de outubro, passou a dizer que o Paraná estava quebrado.

Com a aprovação do projeto, Richa poderá se apropriar de um fundo de cerca de 8 bilhões de reais, a título de “empréstimo” que dificilmente será pago. No futuro, quando professores da ativa se aposentarem, o Paraná não terá mais dinheiro para pagar seus benefícios. Era esta a razão pela qual professores e estudantes de todos os níveis sociais, colorações político-partidários, faixa etária, gênero e religião resolveram enfrentar a truculência do governo e da polícia, ontem.

500 Km distante da capital, um certo temor e angústia me encheu o coração. Medo do que poderia acontecer (e acabou acontecendo) quando um governo irresponsável e assassino convoca seus melhores homens de farda, armados até os dentes, e os coloca frente a frente com a ordem de massacrar e atirar sem dó nem piedade contra os manifestantes.

E quem eram esses manifestantes?

Para o governo (e o comando da polícia), tratavam-se de black bocs, alguns vindos de São Paulo, para tumultuar o protesto e provocar o confronto com a polícia.

E o que as imagens mostraram?

Apenas homens, mulheres, idosos, diabéticos, cardiopatas, cadeirantes, obesos, jovens, moças e rapazes, estudantes… Pessoas comuns, trabalhadores alquebrados e já destruídos fisicamente por anos de trabalho na Educação em condições absolutamente precárias. Pessoas já grisalhas, com rugas nos rostos e as marcas visíveis e invisíveis de anos de trabalho duro entregue à educação pública, estampadas no rosto, nas mãos, na voz e nos cabelos; todos sendo bombardeados pela infâmia do ódio, do Estado criminoso cujo governo trata trabalhadores como bandidos, e de uma corporação militarizada que recebe ordens e prefere agir como se fossem robôs, irracionais, frios e descerebrados.

Outro dia, aqui em Campo Mourão, saí para passear com minha mãe e minha esposa, e fui parado numa blitz de trânsito. Muito amável e educado, após checar meus documentos e os do automóvel, o policial militar e eu trocamos algumas palavras. Ao saber que além de mim mesmo, as duas mulheres que me acompanhavam também eram professoras, o policial, todo orgulhoso, sorriu e disse: “Eu também sou filho de professora. Dois padrões. Professora do Estado do Paraná!”.

Ontem, ao ver as imagens da polícia massacrando os professores no centro cívico, fiquei pensando: estaria este policial entre aqueles cerca de 1.600 convocados pelo governador para reprimir os manifestantes no Centro Cívico? Seria ele um daqueles que decidiram repetir irracionalmente um comando vindo de cima, atirando sem pensar contra sua própria mãe, minha mãe, nossas esposas, maridos e filhos/as que estavam lá protestando de forma legítima contra um governo que quer tirar seus direitos trabalhistas e sua aposentadoria?

Hoje, soube pela imprensa (Gazeta do Povo, Zero Hora) que cerca de 17 policiais foram presos por se recusarem a atirar contra os professores, e agora correm o risco de serem exonerados.

A barbárie do governo do Estado não perdoa nem mesmo os seus.

Enquanto isso, o cheiro do sangue e da pólvora, misturado ao som das bombas que caíram sobre a cabeça de nossos companheiros de profissão, produziram imagens que jamais se apagarão de nossa retina; porque além de tudo, não era contra “black bocs” que a polícia e o governo paranaense estava atirando; era contra nossos próprios pais e mães, irmãos e irmãs, filhos, esposas e maridos que só foram lá lutar pela educação paranaense.

Ao final do dia, contavam-se as vitimas: mais de 200 professores e estudantes feridos, cerca de 60 hospitalizados, e 15 em estado grave. Dos cerca de 10 detidos sob a acusação de serem “black bocs vindos de São Paulo”, estavam 7 lideranças sindicais, além de estudantes.

Nenhuma foto com um único arranhão sofrido pelos cerca de 20 policiais (alegados pelo governo) feridos em confronto havia sido divulgada até a manhã desta quinta.

Isso porque o que houve no Centro Cívico não foi um confronto, e sim um massacre.

Em tom de piada, humor negro, resta dizer que agora, a partir do retorno das aulas (quando a atual greve for encerrada), será incluído como parte obrigatória do uniforme escolar uma máscara de pano, tampando o rosto; ou, como é mais conhecida, “máscara ‘black boc'”.

Também para os alunos que já cursam o Ensino superior (e que, portanto, não utilizam mais uniformes), será incluída a matéria de “BlackBlocquismo: teoria e prática”. As escolas e universidades serão dotadas de campos de treinamento de black bocs, em cuja estrutura existirão caixas eletrônicos, prédios e palácios de governo, para o treinamento na prática do vandalismo.

Para finalizar, qualquer professor paranaense estará habilitado a ministrar essa disciplina, pois de acordo com o governador Beto Richa, quem apanhou da PM no centro cívico ontem não eram professores, e sim apenas black bocs.

Eu conheço alguns destes ‘black bocs’ que estavam “infiltrados” no Centro Cívico e tomaram tiros e borrachada da PM paranaense. Alguns colegas da rede pública, amigos da época de faculdade, um conterrâneo e vizinho meu (Marco Morel, professor da rede pública) e também mestres com os quais aprendi sobre o ofício de minha profissão – de historiador, e de professor. Entre eles, meu estimado colega e ex-orientador de Iniciação Científica, prof. Robson Laverdi​, atualmente docente na UEPG, e que acabou ferido com estilhaços de bomba e/ou tiro de borracha (no calor da hora, ele nem percebeu que havia sido ferido. Só percebeu o ferimento depois, e postou a foto no facebook).

O único black boc presente em Curitiba ontem era o próprio governador Beto Richa, que com sua política irresponsável e truculenta, depreda o patrimônio das aposentadorias de servidores públicos paranaenses, e vandaliza a educação pública paranaense.

Professores e funcionários de escola que, ironicamente, já sofrem com a violência de alunos e pais de alunos que não os respeitam, ofendendo-os e ameaçando-os fisicamente, inclusive de morte; ameaças que às vezes, se concretizam.

A violência contra nossos educadores deveria ser uma aberração, e não a regra.

Mas depois de ontem, quando professores foram humilhados, surrados e ironizados em sua dor pela PM paranaense, pelo governo e seus deputados da base aliada, ficará muito difícil reconstruir o orgulho dessa categoria, e convencer a sociedade (e os próprios professores) que o lugar de professor é na sala de aula, trabalhando com dignidade, direitos garantidos e respeito da sociedade; e não nas ruas e nas prisões, arrastados e com dedos e membros dilacerados pelas bombas, vítimas da humilhação, violência e escárnio.

1 Comentário

1 Comentário

  1. Maria Madalena Ames

    30 de abril de 2015 às 21:27

    Parabéns Emílio bela análise. Lembrando que os professores e funcionários estavam lá também defendendo o Fundo Previdenciário dos policiais que os agrediu.

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