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Coluna do Rogério Tonet: Cidadania Reflexiva (Parte III): O debate como produção de consensos ou o discurso hegemônico como produção de uma dicotomia

Debate é necessário para não ser um teleguiado.

Debate é necessário para não ser um teleguiado.

Por Rogério Tonet*

Dando continuidade às discussões iniciadas desde a primeira semana nesta coluna, hoje, proponho um pequeno avanço dentro da temática, que é a reflexão sobre o debate político e sobre como os discursos produzem imagens idealizadas e opositoras.

Talvez o autor crítico mais interessado em discutir a política enquanto debate seja Jürgen Habermas e, até conseguir formular sua “Teoria da Ação Comunicativa”, recorreu a uma reconstrução histórica (e teórica) sobre como se deu a “publicização” da sociedade, ou seja, como os fatos deixam de ser privados e passam a ser públicos e, em sentido contrário, como os espaços públicos se tornam o espaço para os debates políticos.

A ideia de Habermas, em termos gerais, é que na transição da Idade Média para a Modernidade, alguns espaços, tais como os cafés e teatros, tornaram-se os primeiros espaços para a discussão e disseminação das ideias políticas. Assim, a política era exercida diretamente por homens que poderiam frequentar aqueles espaços.

Avançando, Habermas apresenta a Ação Comunicativa como a forma de, através do debate livre de coações, exista a produção de um consenso tanto sobre as avaliações morais e éticas de uma comunidade, assim como sobre a condução de suas ações conjuntas.

Habermas concebe a ação comunicativa como um modelo ideal e que, portanto, não há sua verificação na prática cotidiana, no entanto, a Internet e as redes sociais parecem ser um novo “espaço público” onde, espera-se, onde possa aflorar um debate político equilibrado.

(Nota: apresentarei os espaços públicos onde a democracia participativa pode ser exercida em coluna posterior)

No entanto, por enquanto, ainda vivemos um,momento de transição, onde a grande mídia ainda controla a agenda do debate político, devido a sua força desproporcional de disseminação de ideias. O debate, então, é inexistente, e a produção de consensos é praticamente uma imposição das grandes redes de TVs, rádios e jornais.

Hoje, apresentarei dois exemplos sobre como a grande mídia exerce este controle – através de dois mecanismos: a omissão e a distorção – e dois exemplos de grupos interessados em estudar sistematicamente este controle.

Exemplos

Para exemplificar, separei dois eventos que geraram (ou não) notícias nos últimos dias e uma rápida análise sobre a forma tendenciosa como estes foram apresentados.

Protestos em Curitiba

Os paranaenses sabem que os protestos ocorridos em Curitiba durante a primeira semana do mês de fevereiro/2015 foram motivados por uma disputa entre o Governo do Estado, representado pelo Governador Beto Richa (PSDB) e todo o funcionalismo estadual, em especial, os professores. A questão central da disputa é um pacote de medidas que retira dos servidores uma série de direitos com o intuito de transferir aos cofres do Estado um volume de recursos para, supostamente, cobrir diferenças geradas pela “baixa arrecadação” que a “crise econômica nacional” ocasionou (sic) – segundo nota divulgada pelo Governo do Estado do Paraná.

Apesar da grande cobertura dada pelos meios de comunicação paranaenses – inclusive da RPC, afiliada local da Globo – o Jornal Nacional não noticiou o acontecimento no primeiro dia e, no segundo dia de protestos, o apresentou de forma descontextualizada, como se fosse uma “invasão” de “grevistas” a Assembléia Legislativa.

Embora a “greve” exista, as motivações para a greve foram omitidas e, aos olhos do espectador desavisado, uma greve sempre será por aumentos salariais ou de benefícios e não por motivações políticas, ou ainda, por uma má gestão do dinheiro público.

A Execução Orçamentária do MEC

O jornal O Estado de São Paulo noticiou em seus veículos a seguinte manchete: “Nos 4 anos de Dilma, MEC teve a pior execução orçamentária desde 2001”.

Esta notícia é o exemplo perfeito sobre como se pode distorcer a realidade falando a verdade ou, como diria meu saudoso professor Belmiro Valverde Jobim Castor, é uma verdadeira aula sobre “como mentir com números”.

Em primeiro lugar, quantas pessoas, dentre os 200 milhões de brasileiros, saberiam dizer o que é Execução Orçamentária? E, mais… se isso é relevante para a vida de todos?

Execução orçamentária é a diferença entre quanto foi previsto no orçamento para determinado ano e quanto foi efetivamente gasto naquele período. É, portanto, uma medida de qualidade de planejamento, mas qual é o número que realmente importa para sabermos qual é o investimento em Educação no Brasil? O valor efetivamente investido (gasto, empenhado) em educação!

A notícia é apresentada em tom sombrio em sua manchete, mas no último parágrafo apresenta o seguinte texto:

“Mesmo com execução orçamentária abaixo da média, os gastos com educação tiveram forte ampliação do governo Dilma. Nos quatro anos, a área recebeu R$ 265 bilhões, valor nominal 93% superior ao gasto no segundo mandato do governo Lula. Se os valores de cada ano são atualizados pela inflação, essa alta é de 55%. Já entre 2003 e 2010 o orçamento da educação havia mais que dobrado. No governo Dilma, foi a primeira vez que a proporção da educação passou a representar mais de 5% do orçamento prevista e também do gasto” (ESTADÃO, 26 de janeiro de 2015).

Assim, apesar da notícia ser rigorosamente verdadeira, apresenta com destaque o negativo irrelevante e, de maneira tímida, os dados que realmente interessam e que são positivos. Que nome se daria para um procedimento como este? Não poderia ser outro se não: MANIPULAÇÃO!

A notícia originalmente veiculada, pode ser lida diretamente no site do Estadãoem: http://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,nos-4-anos-de-dilma-mec-teve-a-pior-execucao-de-orcamento-desde-2001-imp-,1624739

Algumas fontes

Alguns sites tem se comportado como “ilhas” de análises equilibradas e de pensamento (mais) imparcial, dentre eles, citamos aqui:

Observatório da Imprensa: O “Observatório” é uma plataforma de discussão sobre a atuação da imprensa brasileira dirigida por Alberto Dines desde 1996. É um projeto do Laboratório de Estudos Avançados de Jornalismo da Unicamp e conta com um programa semanal em TVs e rádios educativas e um site de internet que permite a interação e debate sobre os temas semana a semana.

O observatório é uma Entidade civil, não-governamental, não-corporativa e não-partidária que pretende acompanhar, junto com outras organizações da sociedade civil, o desempenho da mídia brasileira e o objetivo é “A Sociedade Civil deve abranger sucessivos níveis de monitoração e atuação, de forma a diminuir a distância entre os poderes e a cidadania, convertendo-se ela própria numa instância. No caso dos meios de comunicação de massa, o Observatório da Imprensa propõe-se a funcionar como um atento mediador entre a mídia e os mediados, preenchendo o nosso “espaço social”, até agora praticamente vazio. Embora pioneiro, este Observatório não pretende ser único. As suas atividades servem como convocação para outros grupos fazerem o mesmo”.

O endereço do Observatório da Imprensa é: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/

Manchetômetro:Segundo o próprio site: “O Manchetômetro é um website de acompanhamento diário da cobertura das eleições 2014 na grande mídia, especificamente nos jornais Folha de S. Paulo, O Globo e Estado de S. Paulo, e no Jornal Nacional, da TV Globo. O Manchetômetro é produzido pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP), grupo de pesquisas com registro no CNPq, sediado no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). O Manchetômetro não tem qualquer filiação partidária ou com grupo econômico”.

O Manchetômetro existe desde 2104, embora existam, no site, liks para eleições anteriores e o estudo está se estendendo para o ano de 2015. O Manchetômetro tem sua metodologia descrita e é mantido pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP). O LEMEP é um grupo de pesquisas com registro no CNPq, sediado no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) daUniversidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Enquanto o “Observatório” utiliza-se de uma metodologia qualitativa para analise da mídia, o Manchetômetro, conforme o próprio nome diz, parte de uma abordagem quantitativa, ou seja, a contagem de frequências das capas, manchetes, chamadas, segundo seu conteúdo, dos seguintes veículos: Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, O Globo (os jornais impressos de maior circulação no país) e o Jornal Nacional (telejornal de maior audiência).

O Manchetômetro pode ser acessado em: http://www.manchetometro.com.br/

(Anti)Conclusão

Este espaço busca, todas as semanas, contribuir para o aumento da maturidade da consciência cidadã dos leitores e, desta feita, ofereceu um balanço entre teoria e prática, apresentando ao final dois sites que servem para exemplificar o que foi descrito.

O mais relevante é verificar que tanto o “observatório” quanto o “manchetômetro” tem uma metodologia, um procedimento, para proceder suas análises e, se cada um de nós estabelecesse um procedimento (mesmo que pessoal) de analise, teríamos dado um passo importante na construção de uma cidadania de capacidade reflexiva, conforme já descrito anteriormente.

Prepare-se para aprender a pensar… ninguém pode (ou deve) fazer isso por você!

Recusando-me a ser manipulado!

Rogério Tonet* Rogério Tonet é professor e consultor. Administrador, Mestre (UFPR, 2004) e doutor em Administração (UFSC, 2014), especialista em Marketing e Recursos Humanos. Pesquisador nas áreas de movimentos sociais, democracia participativa e formas alternativas de ocupação e renda. Escreve para o Blog do Raoni todas as quartas-feiras.

5 Comentários

5 Comments

  1. Carlos Augusto

    19 de fevereiro de 2015 às 10:23

    Olá Rogério. Tenho acompanhado essa série de textos e tenho achado imensamente interessante. Queria parabenizá-lo por isso.
    A manchete destacada sobre orçamento na educação é inacreditável. Gostaria de saber de você se realmente instrumentos como este (blog e demais mídias alternativas) podem diminuir a influência da grande mídia nas pessoas.
    Enorme Abraço

  2. Leandro

    19 de fevereiro de 2015 às 10:49

    Ótima reflexão.

  3. Rogério Tonet

    19 de fevereiro de 2015 às 20:52

    Olá Carlos Augusto!

    Obrigado por acompanhar a coluna e o blog! Estamos empenhados em fazer deste (e de outros!!!) espaço um ambiente de debate sério e inteligente… para pessoas que querem pensar junto com a gente e discutir a sociedade em alto nível! Seja bem vindo!

    Quanto à sua pergunta… hoje em dia a força da mídia tradicional ainda é muito grande, mas, a internet e as redes sociais estão crescendo rapidamente, oferecendo grandes oportunidades de debate e questionamento, inclusive, frente as “notícias” (ou factóides) que a “Grande Mídia” produz.

    Veja Carlos, o exemplo da distorção na notícia sobre o orçamento do MEC é “café pequeno”… apenas demonstra do que a mídia – que tem dono e que tem interesses por trás – é capaz de fazer. Eles são profissionais (os melhores) da comunicação… eles sabem escolher as palavras, produzir o discurso, escolher o melhor ângulo, a melhor cor… sabem “editar a verdade” para que ela pareça o que querem que seja.

    Veja esse vídeo e tire suas conclusões: https://www.youtube.com/watch?v=xAAtlLUs_QI

    Obrigado e continue conosco!!!

    Rogério

  4. Rogério Tonet

    19 de fevereiro de 2015 às 20:54

    Olá Leandro!

    Obrigado e continue com a gente…

    Veja meus outros blogs (apesar dos textos mais atuais serem os mesmo daqui… tem outros conteúdos):

    http://www.anacronismocronico.blogspot.com.br/

    http://arteecriticasocial.blogspot.com.br/

    Veja lá…

    Boa sorte!

    Rogério

  5. Rogério Tonet

    21 de fevereiro de 2015 às 6:54

    Olá Leandro!

    Obrigado e continue com a gente…

    Veja meus outros blogs (apesar dos textos mais atuais serem os mesmo daqui… tem outros conteúdos):

    http://www.anacronismocronico.blogspot.com.br/

    http://arteecriticasocial.blogspot.com.br/

    Veja lá…

    Boa sorte!

    Rogério

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