Por Wesley Ribeiro
Lembro-me de como, quando criança, observava o céu noturno enquanto minha mãe conversava com nossa vizinha, na calçada em frente à nossa casa, e maravilhava-me. Hoje, ao observar o céu noturno, já não sofro mais aquele mesmo maravilhamento – naquela época, ele era mais intensamente vivido. A própria palavra maravilhamento já não possui a mesma força que outrora possuira ao ser utilizada para relatar esta minha experiência. Tenho a impressão de que a causa disto é a nossa crença nas explicações que damos a coisas como estas (o céu noturno e os objetos que o compõem) que, na verdade, encontram-se permanentemente imersas em profundo mistério.
Não temos, subjetivamente, muitos bons motivos, motivos verdadeiramente convincentes, para acreditarmos nas ideias que explicam, por exemplo, o mistério do céu e dos objetos que o compõem. Mas deixamos de maravilharmo-nos debaixo de sua magnitude e o mistério que constantemente o envolve é calado por determinadas explicações – as “científicas”, por exemplo. As explicações que apresentamos sobre o céu e sobre outras tantas coisas podem ter origem científica – quando elas provêm do trabalho científico, da atividade científica. Mas nós desconhecemos este trabalho: seu verdadeiro valor e também sua limitação e, ainda assim, acreditamos fielmente nas ideias que ele sustenta. Isto serve, muitas vezes, apenas para calar nosso espírito investigativo, especulativo.
Fala-se, geralmente, sobre a crença no mito, como se fosse uma crença sem qualquer fundamento. Mas a crença subjetiva na ciência, por parte de quem não conhece a ciência “por dentro”, mas a conhece apenas superficialmente, também é uma crença completamente desprovida de qualquer fundamento. Ela baseia-se (o que é muito interessante) na autoridade do discurso que leva o nome de científico – e isto aproxima esta crença mais do mito do que da razão. A necessidade do recurso à autoridade mostra a fraqueza e total vulnerabilidade desta crença. Ao ser questionada a respeito do fundamento de sua crença, a pessoa responde: “a ciência provou ser assim”. Mas, ao portar-se deste modo, esta pessoa mostra que não refletiu sobre sua crença e que sua crença não é fundada sobre qualquer raciocínio ou mesmo sobre qualquer evidência sensível.
Esta postura diante de nossas crenças, torna-nos insensíveis ao maravilhamento do ser, do existir, ao mesmo tempo que torna-nos presas fáceis da manipulação por meio da informação. Basta rotular um discurso ou uma ideia de maneira apropriada para que ganhe-se para ele ou ela a credibilidade de seu interlocutor.
Minha posição diante disto tudo é a seguinte: eu mesmo compartilho estas crenças com meus contemporâneos (parece ser inevitável não compartilhá-las), mas eu não as levo tão a sério. Considero que meu conhecimento sobre todas estas coisas, que envolvem crenças, é muito escasso e impreciso para poder gerar em mim uma confiança razoável sobre elas. Na prática, na maior parte das vezes, ajo como se acreditasse em tudo isto; todavia, na verdade, eu não acredito. Entretanto, minha descrença não possui também uma “prova” a seu favor: ela decorre da falta de fundamentação das ideias que impõe-se à nossa fé.
De qualquer modo, não tenham medo! A lua não deixará de ser o que é por não acreditarmos em uma teoria que explica a sua natureza; o muro não deixará de ser impenetrável devido a não acreditarmos fielmente na teoria que explica a sua concretude; o avião não cairá, caso deixemos de acreditar plenamente nas teorias que explicam o fato de ele poder voar. O que quero dizer é que nossa posição diante disto tudo pode ser, digamos, menos dogmática e mais cética: não teremos nenhum prejuízo, creio, teremos vantagens: a vantagem, por exemplo, de não sermos tão facilmente convencidos e, devido a isto, não corrermos também o risco de sermos igualmente tão facilmente enganados; a vantagem, talvez, de ainda maravilharmo-nos com o mistério das coisas e de, por poder maravilhar-se e perguntar-se a respeito delas como se fossemos completos ignorantes (o que melhor corresponde a nossa real situação), formar – quem sabe? – uma visão mais própria e mais precisa a respeito delas.
Wesley Ribeiro (ou Barsa), é professor de filosofia graduado pela Universidade Estadual de Maringá, mestrando em filosofia pela mesma universidade e músico. Como músico, participou de projetos diversos: em 2009, foi convidado a participar do projeto Impermanente, da Companhia Verve de Dança, junto ao músico inglês Chris Vine; no mesmo ano, participou também de um outro projeto seu, chamado Heat Poets, junto ao poeta inglês Chris Torrance, tendo gravado a bateria para a faixa Taliesin at the console, do disco e livro Rori: A book of the boundaries (publicado em 2011); em 2009 e em 2010, participou, em Maringá, da realização da mostra de música instrumental e artes Curta Som, junto ao violonista (e jornalista) Thales Paiva; durante o ano de 2011, foi professor de bateria na escola de música Som Maior, em Campo Mourão. Desde julho de 2012 até o fim de 2013, acompanhou o músico João Elias, oRaulzito Cover; no primeiro semestre de 2013, incorporou-se ao projeto do professor e músico William Versori, chamado Acordes e Encontros, apresentando-se junto ao Grupo Contratempo e ensinando percussão brasileira e leitura e escrita musical para crianças de colégios estaduais da cidade de Campo Mourão; desde o início do segundo semestre de 2013, tem integrado oRegional Pé de Pano, dirigido pelo professor e músico César Leandro Miguel. Durante o ano de 2014, desenvolverá, junto ao músico inglês Chris Vine, o projeto de música improvisacional livreBarsa e Briggy. Como professor de filosofia, atua junto ao Colégio Sesi de Campo Mourão desde 2012, foi professor colaborador da Unespar em 2013 e é professor da rede estadual de educação básica desde o ano passado.