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Cultura

Coluna do Wesley Ribeiro: Sobre as greves em geral e, de um modo particular, sobre a atual greve dos trabalhadores da educação do Estado do Paraná

Direito a greve

Por Wesley Ribeiro*

É muito comum que, em períodos de greve de trabalhadores, a mídia (pelo menos a parte mais influente dela, aquela que representa o interesse de seus ricos patrocinadores e não o interesse dos trabalhadores) divulgue a greve como algo que vem apenas a prejudicar a sociedade como um todo e também os próprios trabalhadores. É assim, por exemplo, que ela divulga greves como as dos motoristas de ônibus, as dos bancários e as greves dos professores, entre outros exemplos que podem ser dados – consultem suas memórias ou os jornais e verifiquem ou refutem minha afirmação. Deixa-se de mencionar a natureza “progressista” das greves: elas, muitas vezes, não apenas representam os interesses de uma categoria específica de trabalhadores (os professores, os policiais, os bancários, os trabalhadores da saúde, etc.), mas podem também representar um interesse maior, digamos, um “bem comum”. Cabe a nós, cidadãos, irmos além das poucas e distorcidas informações oferecidas pela mídia e considerarmos cada caso. De todo modo, ainda que uma greve de uma categoria específica de trabalhadores não venha ao encontro de um “bem comum”, mas não o contrarie, ou seja, ainda que esta greve venha apenas ao encontro de um interesse específico desta categoria, nós não podemos condená-la, porque estaríamos assim condenando a luta desta categoria por melhores condições de trabalho, melhor remuneração, etc. e, desta forma, condenaríamos, de um modo geral, a greve enquanto uma maneira de conquistar estas melhorias (eis aqui a noção de progresso que presentemente utilizo: a contínua conquista de melhores condições de trabalho e também de melhorias sociais): condenaríamos nosso próprio direito à greve. Tomarei em consideração, para ilustrar este   pensamento sobre as greves, o caso específico da greve dos trabalhadores da educação do Estado do Paraná – eu poderia também falar sobre as greves de todas as outras categorias que estão sendo iniciadas em nosso Estado (é importante ao menos mencionar que elas estão acontecendo) mas, por motivos “espaciais”, “temporais” e também porque sou professor, ficarei apenas com o caso da greve dos educadores. Procurarei mostrar, ainda que de um modo superficial, como a greve dos trabalhadores da educação não contempla apenas interesses específicos da própria categoria – o que não quer dizer que as demais greves não contemplem o que chamo aqui de “bem comum” e também que, caso contemplassem apenas interesses específicos de sua categoria, elas não seriam legítimas.

Desde ontem, dia nove de fevereiro, os trabalhadores da educação encontram-se em greve por prazo indeterminado. É bastante provável que a mídia venha dizer algo como “milhares de alunos estão sendo prejudicados com a greve geral dos professores”, mas não mencionarão os motivos desta greve – é evidente que, na atual conjuntura política no Estado do Paraná, haverão também aqueles que, por um motivo ou outro, a aprovarão publicamente. De qualquer modo, quais são os motivos dela? A proposta do governo que, se aprovada, piorará o plano de carreira do magistério no Estado e também dos funcionários das escolas públicas do Estado (que já não é dos melhores, mas resulta de uma contínua luta dos trabalhadores da educação – existente há décadas); a superlotação das salas de aula (devido ao fechamento de escolas e turmas); a redução do quadro de funcionários das escolas estaduais; a falta de pagamento dos salários; entre outras coisas. Entendo que esta luta não diz respeito só aos trabalhadores da educação, porque ela vem ao encontro de um “bem comum”: todas as coisas que motivam esta greve não representam um ataque apenas contra os interesses dos trabalhadores da educação, mas caracterizam um ataque contra a sociedade como um todo, especialmente contra os mais pobres, aqueles que dependem da escola pública para sua formação.

A situação da educação brasileira, de um modo geral, já não é fácil, mas no Paraná ela vem agravando-se ainda mais: nosso governo estadual tem nos mostrado que não confere muito valor à educação pública – e ao funcionalismo público de um modo geral, dado que, em meio a uma crise financeira cujos motivos ainda não são bem claros, pretende instaurar mudanças que impõem aos educadores, dentre os demais funcionários públicos do Estado, o pagamento de, pelo menos, boa parte do custo desta crise. Ao prejudicar os trabalhadores da educação, prejudica-se a própria educação pública e, portanto, todos aqueles que são por ela atendidos. Quando não há um bom plano de carreira, a profissão não é atraente – para que surjam novos professores e também para que os professores existentes não desejem deixar a educação – e, ao mesmo tempo, os profissionais não são estimulados a um contínuo aperfeiçoamento enquanto trabalhadores e enquanto agentes de uma possível transformação social; com a superlotação das salas de aula, os professores não conseguem atender satisfatoriamente aqueles alunos com maior dificuldade – a maior parte deles, diga-se de passagem, e torna-se muito difícil manter a disciplina da turma – essencial para que o aprendizado ocorra; sem um número adequado de funcionários, os alunos e a comunidade não podem ser atendidos satisfatoriamente; sobre os salários, deve-se dizer algo? Trabalhar sem receber remuneração não é coisa adequada aos tempos em que nos encontramos – seria mais adequado a um perído de escravidão. Quando os alunos não são bem atendidos (e com eles toda a comunidade), a aprendizagem e a formação destes alunos são comprometidas. O resultado disto tudo nós já conhecemos: os alunos deixam a escola sem dominar a leitura, a escrita e a fala; sem dominar os conceitos filosóficos, científicos e artísticos que nos permitem pensar nossas vidas e nossa realidade, que tornam possíveis a autonomia e a própria cidadania; sem dominar as habilidades que lhes serão úteis não apenas em suas vidas profissionais – e boa parte de nossa população já passou, está passando ou passará por uma escola pública; portanto, a atual greve dos professores do Estado do Paraná não diz respeito somente a nós, professores e trabalhadores da educação em geral, mas, se não a todos, à maior parte dos paranaenses.

Para concluir, direi que a greve, em muitos casos, é a única opção deixada aos trabalhadores e nós, trabalhadores, se não quisermos abrir mão de nossas conquistas, não podemos abrir mão dela. Pelo que foi exposto, é muito importante para nós, educadores, neste momento, que nossos alunos e toda a comunidade apoie nosso movimento por uma educação melhor. É muito importante que eles não deixem-se levar pelas opiniões de uma mídia que propaga a estupidez e não o esclarecimento. É muito importante que busquem compreender e apoiem nossa greve.

Wesley Ribeiro*Wesley Ribeiro (ou Barsa), é professor de filosofia graduado pela Universidade Estadual de Maringá, mestrando em filosofia pela mesma universidade e músico. Como professor de filosofia, atua junto ao Colégio Sesi de Campo Mourão desde 2012, foi professor colaborador da Unespar em 2013 e aguarda a nomeação para o concurso da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Escreve para o Blog do Raoni toda a terça-feira.

7 Comentários

7 Comments

  1. Molina

    10 de fevereiro de 2015 às 19:56

    Oi Barça! parabéns pela coluna!
    Te pergunto – Se os funcionários da copel e da sanepar, entrarem em greve, cortando a água e a luz, como será então o comportamento dos cidadãos? Água e luz são essenciais e educação também o é, ou não?

  2. Raphael Lavezzo

    11 de fevereiro de 2015 às 17:44

    Professor, tudo o que foi dito e bem elucidado por você concordo, e creio que é necessário manter essa greve, pois só assim esses trabalhadores que constituem atividades essenciais em nossa sociedade poderão exercer seu trabalho com dignidade. Digo ainda que existe um enorme desreipeito por esses profissionais que são a base para todas as profissões. Parabéns pela coluna, muito bem escrita e articulada, irei ler sempre que puder.

  3. Wesley Ribeiro

    11 de fevereiro de 2015 às 19:31

    Olá, Molina! Obrigado por ter lido meu texto!

    Certamente a educação é fundamental, meu amigo – creio que ela seja como água e luz para nosso espírito! Mas as pessoas, muitas vezes, talvez exatamente por não estarem bem nutridas pela educação, não reconhecem o seu valor! Ouvem apenas o roncar de suas barrigas, mas não o roncar de fome de seu espírito!

    Um forte abraço! Tudo de bom!

  4. Wesley Ribeiro

    11 de fevereiro de 2015 às 19:34

    Muito obrigado, Raphael!

  5. Maria Claudia

    18 de fevereiro de 2015 às 18:25

    Muito bom seu texto e vem de encontro a vários aspectos que temos questionado em relação à essa greve em especial, considerando que ela não objetiva salário, o que é legítimo a qualquer cidadão, ela busca respeito aos direitos conquistados não apenas da categoria, mas de toda a sociedade, já que a escola pública é um em social. A manutenção de uma educação pública e com qualidade é essencial para qualquer sociedade que busque o seu desenvolvimento.

  6. Wesley Ribeiro

    19 de fevereiro de 2015 às 15:22

    Fico feliz que tenha gostado do texto e sou muito grato por seu comentário, Maria Claudia!

  7. Boss

    6 de março de 2015 às 6:03

    Thnaks for taking the time to post. It’s lifted the level of debate

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